Em um caso que ilustra bem a complexidade das normas sobre benefícios para médicos residentes, um profissional que residia na mesma cidade onde realizava sua residência médica precisou recorrer à Justiça para garantir o direito ao auxílio-moradia. A controvérsia girava em torno da interpretação da Lei nº 12.514/2011, que garante aos médicos residentes o direito a condições de repouso, alimentação e moradia, independentemente de seu local de domicílio. A falta de regulamentação específica sobre o benefício levou a instituição de saúde a negar o auxílio-moradia, alegando que o médico já residia na cidade, mas a Justiça entendeu de forma diferente.
O ponto central do caso foi a ausência de regulamentação detalhada sobre o fornecimento de moradia aos médicos residentes, prevista na Lei nº 12.514/2011. O artigo 1º dessa lei alterou a redação da Lei nº 6.932/1981, que trata sobre residência médica, e estipulou que as instituições de saúde responsáveis pelos programas de residência médica devem oferecer aos residentes condições adequadas para repouso, higiene, alimentação e moradia. No entanto, o regulamento que deveria definir os critérios para a concessão desses benefícios ainda não foi editado, criando uma lacuna jurídica.
A instituição de saúde argumentou que o médico residente não tinha direito ao auxílio-moradia, uma vez que ele já residia na mesma cidade onde se localizava a instituição de ensino. Essa interpretação, no entanto, foi rejeitada pelo Judiciário. O Tribunal entendeu que a ausência de regulamentação não pode ser usada como justificativa para prejudicar o beneficiário, assegurando o direito à indenização por perdas e danos no valor correspondente ao auxílio-moradia que não foi pago.
A defesa da instituição de saúde baseou-se na tentativa de restringir o benefício do auxílio-moradia apenas aos médicos que não residissem no local da entidade onde realizavam a residência médica. Contudo, o tribunal foi claro ao afirmar que a Lei nº 12.514/2011 não impõe tal restrição. O direito ao auxílio-moradia é garantido a todos os médicos residentes, independentemente de onde moram, uma vez que a lei não faz distinção entre residentes locais ou de outras regiões.
A Justiça reafirmou que a interpretação restritiva proposta pela instituição não encontra respaldo legal. O STJ já firmou entendimento em diversos julgados de que, em situações onde há omissão regulatória por parte do Poder Público, a parte prejudicada – no caso, o médico residente – não pode ser penalizada. Em vez disso, é garantido o direito à indenização por perdas e danos, sendo o valor do auxílio-moradia calculado com base em 30% do valor bruto da bolsa mensal recebida pelo residente.
No caso concreto, o autor da ação, um médico residente, ingressou no programa de residência em março de 2022 e não recebeu o auxílio-moradia desde o início do curso. Com base nos documentos apresentados, foi possível calcular o valor devido com relação aos meses de atraso. Seguindo a jurisprudência estabelecida, o percentual de 30% sobre o valor bruto da bolsa mensal foi utilizado como base de cálculo para fixar o valor da indenização.
Além disso, a decisão judicial determinou que a instituição de saúde responsável pelo programa de residência médica deve continuar pagando o auxílio-moradia até o final do curso de residência, uma vez que a obrigação é permanente enquanto durar o vínculo entre o médico residente e a instituição.
Este caso concreto deixa claro que a ausência de regulamentação não pode ser utilizada como justificativa para a negativa de direitos aos médicos residentes. A Lei nº 12.514/2011 é explícita ao garantir a esses profissionais condições mínimas de trabalho e dignidade, incluindo alimentação, repouso e moradia, independentemente de seu local de residência. A Justiça, ao interpretar de forma protetiva os direitos dos residentes, assegura que o benefício do auxílio-moradia seja concedido mesmo àqueles que já residem na cidade onde realizam sua residência médica.
A decisão também reforça a responsabilidade das instituições de saúde em cumprir com suas obrigações contratuais, assegurando a concessão dos direitos previstos na lei. Enquanto o Poder Público não editar a regulamentação necessária, cabe ao Judiciário preencher essa lacuna e garantir que os médicos residentes não sejam prejudicados pela inércia estatal.
Por fim, este caso serve de exemplo para outros profissionais que enfrentam situações semelhantes, mostrando que o direito ao auxílio-moradia deve ser respeitado e que, em caso de negativa, há base jurídica sólida para buscar a indenização por meio do Judiciário.
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