Falha na segurança bancária  e responsabilidade das instituições financeiras

Em um contexto onde as fraudes digitais crescem em ritmo acelerado, casos envolvendo transferências bancárias não reconhecidas e resgates indevidos de investimentos têm se tornado cada vez mais comuns. Uma recente decisão judicial evidenciou, mais uma vez, a existência de falha na segurança bancária ao reconhecer a responsabilidade de instituição financeira por prejuízos causados a um cliente idoso, vítima de um golpe sofisticado.

 

O caso concreto

O cliente, de 78 anos, mantinha conta de investimentos com movimentação conservadora e previsível, restrita a aplicações e transferências entre contas de sua própria titularidade. Em julho de 2023, recebeu uma mensagem SMS informando sobre a ativação de um token em novo dispositivo, seguida de um contato telefônico de suposto funcionário da corretora, que o induziu a acessar um site falso e seguir comandos para "proteção da conta".

A partir dessa interação fraudulenta, todos os investimentos do cliente foram resgatados e transferidos via PIX e TED para terceiros, em transações atípicas que ocorreram em um curto espaço de tempo. O cliente tentou contato com seu assessor e com o serviço de atendimento das instituições financeiras, mas não obteve retorno imediato. Mesmo após notificar o golpe, novas movimentações indevidas seguiram ocorrendo.

 

Responsabilidade objetiva e fortuito interno

A sentença proferida reconheceu a falha na segurança bancária ao considerar que as operações realizadas destoavam completamente do padrão de uso da conta do consumidor. Conforme a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça, é objetiva a responsabilidade das instituições financeiras por danos decorrentes de fraudes, uma vez que estas se enquadram no chamado "fortuito interno" do negócio bancário.

Ainda que o consumidor tenha colaborado involuntariamente para a consumação do golpe, ao seguir as orientações do fraudador, a decisão enfatiza que às instituições cabe implementar mecanismos eficazes de segurança que detectem transações atípicas ou com potencial risco, especialmente quando se trata de clientes com perfis conservadores e em situação de vulnerabilidade, como é o caso de idosos.

 

Dever de cuidado e gestão de riscos

Ao disponibilizarem plataformas digitais que possibilitam movimentações financeiras substanciais por meio de dispositivos móveis, os bancos e corretoras assumem o dever de proteger seus clientes contra fraudes. A falha na segurança bancária não está restrita à existência de brechas tecnológicas, mas também à ausência de procedimentos eficazes de alerta e bloqueio automático diante de movimentações que destoam dos hábitos do cliente.

No caso analisado, mesmo após a notificação do golpe pelo cliente, a plataforma permitiu novas transferências atípicas nos dias subsequentes. Tal comportamento revela não apenas uma omissão, mas também uma deficiência grave na gestão dos riscos operacionais, o que configura clara falha na segurança bancária.

 

Proteção especial ao consumidor idoso

O Estatuto do Idoso e o Código de Defesa do Consumidor garantem proteção especial à pessoa idosa em relações contratuais. No caso, o juiz ponderou que as instituições financeiras, cientes da frequência com que golpes como esse são aplicados, especialmente contra idosos, devem adotar mecanismos de segurança mais rigorosos, o que não ocorreu. A negligência nesse aspecto reforça a caracterização da falha na segurança bancária.

 

Decisão judicial e seus efeitos

Diante das provas e da inércia das rés em prevenir ou interromper a fraude em tempo hábil, o Judiciário determinou a restituição integral dos valores subtraídos, reconhecendo o dano material causado e a responsabilidade solidária das instituições envolvidas. A sentença também destacou que a existência de validação biométrica ou uso de dispositivo cadastrado não exime os bancos do dever de verificar a compatibilidade das operações com o perfil do cliente.

 

Considerações finais

A jurisprudência tem consolidado o entendimento de que é dever das instituições financeiras garantir a segurança nas operações realizadas por seus canais eletrônicos. Situações como a analisada, em que o cliente tem suas economias de uma vida esvaziadas em minutos por meio de um golpe, reforçam a importância de sistemas antifraude eficientes e do respeito à vulnerabilidade do consumidor.

Casos envolvendo falha na segurança bancária devem ser analisados com rigor, não apenas sob a ótica contratual, mas também sob a ótica da responsabilidade civil e do dever de informação, prevenção e proteção de dados, para garantir à sociedade um ambiente financeiro mais seguro e confiável.

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