Erro de informação e vício de consentimento em contratos de investimento

Tomar decisões financeiras exige confiança. Quando essa confiança é traída por informações incompletas, distorcidas ou inverídicas, a própria base do negócio jurídico se torna instável. Em termos jurídicos, estamos diante do erro de informação — uma falha que compromete a vontade do contratante e pode gerar vício de consentimento em contratos de investimento.

 

O dever de informação no mercado financeiro

O dever de informação é uma das expressões mais importantes da boa-fé objetiva nas relações contratuais. No contexto financeiro, ele impõe ao assessor, corretora ou instituição a obrigação de esclarecer o investidor sobre o funcionamento do produto, seus riscos, prazos, liquidez e eventuais limitações.

Quando o profissional promete segurança onde há risco, ou liquidez onde há bloqueio contratual, está violando esse dever. Tal omissão ou distorção leva o consumidor a agir confiando em premissas falsas — o que caracteriza o erro substancial, previsto no artigo 138 do Código Civil.

O erro de informação, portanto, não se resume a um simples mal-entendido. Ele atinge o cerne da manifestação de vontade e transforma um contrato aparentemente válido em um ato contaminado por vício de consentimento.

 

Relação de consumo e responsabilidade objetiva

As relações entre investidores e assessorias financeiras, mesmo quando envolvem produtos sofisticados, são frequentemente reconhecidas como relações de consumo. Isso significa que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) se aplica e impõe regras específicas de proteção.

Entre elas, o art. 6º, inciso III, assegura o direito à informação adequada e clara sobre produtos e serviços. E o art. 14 estabelece a responsabilidade objetiva das instituições por falhas na prestação do serviço — ou seja, o dever de indenizar independe de culpa.

Assim, se o consumidor prova que tomou uma decisão de investimento induzido por uma informação incorreta, cabe à instituição demonstrar que agiu com diligência e que o erro não decorreu de sua conduta. Essa inversão do ônus probatório busca equilibrar a relação, já que o investidor, em regra, não dispõe dos mesmos meios técnicos e informacionais das instituições financeiras.

 

O vício de consentimento e a anulação do contrato

O vício de consentimento ocorre quando a vontade do contratante é formada a partir de uma percepção equivocada da realidade. No âmbito dos investimentos, isso acontece quando o investidor acredita, por exemplo, que seu capital é líquido, que há garantia de rentabilidade ou que os riscos são mínimos — quando, na verdade, a operação é de alto risco e de longo prazo.

Nessas situações, o contrato nasce com defeito. O erro substancial, reconhecido como causa de anulação, torna o negócio jurídico inválido desde sua origem. A consequência é o retorno das partes ao estado anterior, com a restituição dos valores pagos, possivelmente em dobro, conforme o art. 42, parágrafo único, do CDC, se demonstrada a má-fé do fornecedor.

Em muitos julgados recentes, os tribunais têm entendido que o erro de informação praticado por assessorias de investimento constitui falha grave, suficiente para desfazer contratos de crédito, seguros ou aportes em fundos de risco, sobretudo quando o investidor é pessoa física e sem experiência técnica.

 

A relevância da boa-fé objetiva

A boa-fé objetiva orienta toda a interpretação e execução dos contratos. Ela exige lealdade, transparência e cooperação entre as partes. No mercado financeiro, essa obrigação ganha força redobrada, pois o investidor confia que o profissional atua em seu melhor interesse.

Quando essa confiança é violada, o ordenamento jurídico responde com firmeza. A conduta que induz o consumidor a erro não apenas vicia o consentimento, mas também rompe o dever de lealdade contratual e pode ensejar responsabilidade civil por danos materiais e morais.

Assim, cláusulas complexas, prospectos incompletos ou promessas verbais não documentadas devem ser examinados com cautela. A ausência de registros e gravações pode, inclusive, reforçar a presunção de falha na prestação do serviço.

 

Consequências práticas do erro de informação

O reconhecimento judicial do erro de informação em contratos de investimento gera múltiplas consequências:

  • anulação dos negócios jurídicos;
  • restituição integral (ou em dobro) dos valores desembolsados;
  • cancelamento de garantias e negativação indevida;
  • indenização por danos morais, quando o episódio gera angústia, insegurança ou perda patrimonial relevante.

Além dos efeitos patrimoniais, há também um efeito pedagógico. As decisões judiciais que reconhecem o vício de consentimento servem como alerta às instituições para reforçar a transparência e o controle interno de seus agentes.

 

Conclusão

O erro de informação mina a confiança que sustenta o mercado de investimentos. Quando o investidor age com base em dados falsos ou omissões relevantes, o contrato deixa de ser expressão de sua vontade livre e consciente. Nesses casos, o direito intervém para restaurar o equilíbrio, anulando o negócio e impondo as reparações cabíveis.

Mais do que uma questão técnica, trata-se de preservar a essência da boa-fé e a proteção do consumidor diante da assimetria informacional que caracteriza o sistema financeiro. O respeito ao dever de informação é, portanto, a chave para evitar litígios e assegurar a integridade dos contratos de investimento no Brasil.

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