O tema da sucessão (direito aos bens deixados pelo falecido) em casos de união estável é complexo e tem gerado diversas discussões no âmbito jurídico. Em especial, a questão da concorrência entre o cônjuge/companheira sobrevivente e os descendentes do falecido tem sido objeto de análise e interpretação por parte da legislação e da jurisprudência brasileira. No presente artigo, abordaremos essa questão à luz do artigo 1.829, I do Código Civil, discutindo os tipos de regimes como a comunhão parcial de bens , entendimentos doutrinários e jurisprudenciais, bem como a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que impacta diretamente nessa matéria.
Primeiramente, é importante destacar que a legislação brasileira permite que casais em união estável escolham diferentes regimes de bens para regerem sua convivência. No caso abordado no texto, o casal optou pelo regime equivalente ao da comunhão parcial de bens, nos termos do artigo 1.725 do Código Civil. Isso significa que, durante os anos de convivência, os bens adquiridos pelo casal são considerados comuns. É o regime regra no Brasil.
O cerne da questão gira em torno do artigo 1.829, I do Código Civil, que estabelece a ordem de sucessão legítima. O texto diz que a sucessão legítima defere-se aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo em determinadas exceções, como quando o autor da herança (falecido) houver deixado bens particulares. A interpretação desse dispositivo legal tem sido objeto de debate entre doutrinadores e tribunais brasileiros.
José Fernando Simão e Rolf Madaleno compartilham do entendimento de que, pelo sistema jurídico brasileiro atual, o cônjuge ou convivente/companheiro herda independentemente do regime matrimonial, desde que não estejam separados de direito, divorciados, nem separados de fato há mais de 02 (dois) anos. Isso significa que, em uniões regidas pelo regime da comunhão parcial de bens, o cônjuge sobrevivente só concorre com os descendentes se o falecido tiver deixado bens particulares.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem corroborado esse entendimento. Há um caso emblemático em que a Segunda Seção firmou o entendimento de que o cônjuge sobrevivente, casado no regime de comunhão parcial de bens, concorre com os descendentes somente quando o falecido deixou bens particulares. Essa concorrência se dá exclusivamente em relação aos bens particulares constantes do acervo hereditário do de cujus (falecido).
Houve uma decisão tomado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em um recurso extraordinário, que teve grande relevância para a discussão sobre a sucessão em casos de união estável. Nesse recurso extraordinário, o STF abordou a constitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil.
O artigo 1.790 do Código Civil estabelecia uma diferenciação nos direitos sucessórios entre cônjuges casados no regime de comunhão universal de bens e companheiros em união estável. Essa diferenciação era vista como uma desigualdade, na medida em que tratava de maneira distinta a sucessão entre casais casados e casais em união estável.
O Supremo Tribunal Federal, por meio do julgamento desse recurso extraordinário, concluiu que essa diferenciação era inconstitucional, ou seja, violava princípios fundamentais da Constituição Federal relacionados à igualdade e à não discriminação. Portanto, o STF determinou que, para efeitos de sucessão, os companheiros em união estável deveriam ser tratados da mesma forma que os cônjuges casados, seguindo as regras do artigo 1.829, I do Código Civil.
Essa decisão teve um impacto significativo, pois nivelou os direitos sucessórios entre casais casados e casais em união estável, garantindo uma maior igualdade nas situações de sucessão hereditária. Portanto, a partir desse julgamento, a sucessão dos companheiros deve observar as mesmas regras estabelecidas para os cônjuges, como previsto no artigo 1.829, I do Código Civil, independentemente do regime de bens adotado durante a união estável.
Essa mudança jurisprudencial reforça a importância de se analisar a legislação e as decisões judiciais mais recentes ao tratar de questões de sucessão em uniões estáveis, a fim de garantir que os direitos das partes sejam devidamente respeitados e aplicados de acordo com a atual interpretação legal.
Pensem em um caso que o casal conviveu por alguns anos em união estável sob o regime equivalente à comunhão parcial de bens, sendo que o companheiro faleceu e deixou bens particulares.
A companheira, mesmo que o companheiro ainda fosse casado (porém separado de fato (e não divorciado) há alguns anos), terá direito a concorrer com os descendentes do falecido (a exemplo dos filhos por ele deixados) em relação a esses bens particulares.
A sucessão em casos de união estável é um assunto complexo e em constante evolução no sistema jurídico brasileiro. O entendimento atual, apoiado por decisões do STJ e pelo STF, estabelece que o companheiro/companheira sobrevivente concorre com os descendentes (filhos) apenas quando o falecido deixou bens particulares. E isso acontece mesmo em hipóteses em que o de cujus tinha uma outra relação matrimonial (outro casamento), mesmo sem estar divorciado, mas sim separado judicialmente ou de fato há algum tempo.
Em verdade, a análise da sucessão em uniões estáveis requer cuidado e atenção aos detalhes legais e jurisprudenciais, para garantir a justiça e a igualdade entre os herdeiros. Uma consulta a um advogado especialista faz a diferença. Existem muitas pessoas que têm direito à herança de um ente querido e não imagina.
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