Se você é médica(o) ou sócia(o) de uma clínica médica, é importante estar familiarizado com o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS ou ISSQN). Esse imposto é devido pelos prestadores de serviços, e a base de cálculo comumente utilizada pelos municípios é uma alíquota de 2% a 5% sobre o faturamento. No entanto, existe uma modalidade alternativa de tributação para clínicas médicas, chamada de ISS fixo. Neste artigo, vamos abordar os principais pontos relacionados ao ISS fixo para clínicas médicas, incluindo seus requisitos e a base legal que o sustenta.
Ao optar pelo enquadramento da clínica médica no regime fixo de ISS, é possível obter vantagens significativas em termos de economia de dinheiro. Isso ocorre porque o ISS fixo é calculado com base em uma alíquota fixa estabelecida pela legislação municipal, independentemente do faturamento da clínica. Assim, mesmo que a receita varie ao longo do ano, o valor do imposto permanecerá constante, o que proporciona maior previsibilidade financeira e facilita o planejamento tributário.
O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) é um tributo de competência dos municípios brasileiros. Ele incide sobre a prestação de serviços, incluindo serviços de medicina. No regime comum, o ISS é calculado a partir de uma alíquota que varia de 2% a 5% sobre o faturamento da clínica médica.
O ISS fixo para clínicas médicas encontra respaldo legal no Decreto-Lei 406/69, que estabelece as bases para a cobrança do imposto. De acordo com o artigo 9º desse decreto, quando se trata da prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto pode ser calculado por meio de alíquotas fixas ou variáveis, levando em consideração a natureza do serviço ou outros fatores relevantes. No entanto, a remuneração do próprio trabalho não é incluída na base de cálculo do imposto.
Além disso, o parágrafo 3º desse mesmo artigo estabelece que, quando os serviços mencionados na lista anexa ao decreto (itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91 e 92) são prestados por sociedades, elas ficam sujeitas ao imposto na forma do parágrafo 1º. Isso significa que as sociedades serão tributadas com base em cada profissional habilitado, seja ele sócio, empregado ou não, que presta serviços em nome da sociedade, assumindo responsabilidade pessoal.
Existem requisitos estabelecidos pela jurisprudência para que uma clínica médica possa se enquadrar no regime de ISS fixo. Vejamos alguns desses requisitos:
A produção da clínica médica deve ser a soma das produções individuais dos profissionais envolvidos. Em outras palavras, inicialmente, os serviços poderiam ser prestados por apenas um dos sócios individualmente. É necessário preservar a relação pessoal entre o prestador de serviços e o cliente. Um exemplo disso é o médico pediatra recém-formado que atende seus primeiros clientes no consultório, sem uma estrutura empresarial.
A clínica médica deve ser considerada uniprofissional, ou seja, voltada para a prática de uma única profissão. Isso significa que sua estrutura não pode ser empresarial, não podendo se sobrepor à figura individual dos sócios. Além disso, os sócios devem ter responsabilidade pessoal.
A clínica médica deve ser constituída como uma sociedade simples, não empresarial. A relação pessoal de confiança entre o prestador de serviços e o cliente deve ser relevante, e o trabalho do profissional não deve ser apenas mais um fator produtivo dentro de uma lógica empresarial.
O regime de ISS fixo não é permitido para clínicas médicas optantes pelo Simples Nacional. No entanto, existem julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo que admitem o ISS fixo no Simples Nacional, desde que haja previsão legal no município.
A opção pelo Simples Nacional, contudo, pode não ser a melhor escolha para algumas clínicas, especialmente aquelas com despesas de folha de pagamento inferiores a 28% da receita bruta. Nestes casos, optar pelo lucro presumido, que permite o enquadramento no ISS fixo, tende a ser mais benéfico do ponto de vista fiscal.
Algumas Prefeituras impõem requisitos que não são previstos legalmente. No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionalidade de leis municipais que estabelecem impeditivos à submissão de sociedades profissionais ao regime de tributação fixa. Portanto, os seguintes elementos não podem ser exigidos pelas Prefeituras:
A barreira mais comum que as Prefeituras trazem ao enquadramento da clínica no ISS fixo é que a responsabilidade dos sócios não pode ser limitada ao patrimônio ou subsidiária à da sociedade, no contrato social.
Porém, no caso da medicina, além do Código de Ética Médica, a Resolução CFM nº 1.971/2011 disciplina a responsabilidade técnica. Dessa forma, a limitação da responsabilidade pelas dívidas da sociedade, mesmo que prevista no contrato social, não exclui a responsabilidade pessoal pelos atos praticados no exercício da profissão médica.
Nesse sentido, o Conselho de Justiça Federal (CJF) aprovou o Enunciado nº 474 durante a V Jornada de Direito Civil, estabelecendo que os profissionais liberais podem se organizar sob a forma de sociedade simples, convencionando a responsabilidade limitada dos sócios por dívidas da sociedade, mesmo mantendo a responsabilidade ilimitada por atos praticados no exercício da profissão.
Ademais, o Código Civil, em seu artigo 983, admite que uma sociedade simples possa se constituir como sociedade limitada, desde que seu objeto não seja empresarial. Portanto, a menção à "responsabilidade pessoal" no §3º do artigo 9º do Decreto-lei 406/69, transcrito acima, refere-se à responsabilidade profissional e não à responsabilidade social dos sócios.
Essa interpretação encontra respaldo no julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no EAREsp. n. 31.084/MS, no qual ficou estabelecido que a espécie societária adotada pela pessoa jurídica não é relevante para a concessão do regime tributário diferenciado. Conforme destacado pelo STJ, pode haver sociedades limitadas que não são consideradas empresárias, conforme previsto nos artigos 982 e 983 do Código Civil.
O contrato social não precisa prever uma forma específica de distribuição de resultados, como retirada de pró-labore ou divisão proporcional ao capital social. A partilha dos resultados entre os sócios pode ocorrer de acordo com a produção individual para a sociedade.
A forma de registro da sociedade não tem relevância jurídica para a aplicação do regime de ISS fixo. O que importa é a atividade exercida pela sociedade.
Para comprovar o enquadramento no regime de ISS fixo, é necessário realizar um exame do contrato social da clínica médica. Geralmente, essa análise é suficiente para demonstrar se a sociedade se enquadra nos requisitos estabelecidos pela jurisprudência. Além disso, outros elementos podem ajudar na comprovação, como fotos das instalações e a constatação de que a receita consiste apenas no preço das consultas.
O regime de ISS fixo é uma alternativa ao regime comum de tributação para clínicas médicas. O enquadramento no regime fixo de ISS pode trazer economia de dinheiro significativa para a clínica médica, proporcionando maior previsibilidade financeira e facilitando o planejamento tributário
Para se beneficiar desse regime, é necessário atender aos requisitos estabelecidos pela jurisprudência, como a pessoalidade, o caráter uniprofissional da sociedade, a estrutura como sociedade simples e não estar enquadrado no Simples Nacional. É importante também estar ciente de que algumas Prefeituras podem impor requisitos adicionais, mas o STF reconheceu a inconstitucionalidade dessas imposições. Por fim, a comprovação do enquadramento no regime de ISS fixo pode ser feita por meio da análise do contrato social da sociedade e de outros elementos que demonstrem a natureza da clínica médica.
Se você é médica(o) ou dona(o) de uma clínica médica, é essencial contar com o auxílio da advocacia especializada em direito tributário aplicado à atividade da medicina, para avaliar a viabilidade e o enquadramento no regime de ISS fixo, além de fornecer orientações adequadas para o seu caso específico.
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