Uma recente decisão da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo trouxe à tona um ponto essencial nas ações de responsabilidade civil por erro médico: a aplicação da inversão do ônus da prova. A controvérsia girava em torno da responsabilidade de custear a perícia judicial, e a conclusão reforça a proteção do consumidor nos casos em que há verossimilhança das alegações e hipossuficiência técnica.
O caso teve origem em uma ação indenizatória contra um plano de saúde e médicos por suposto erro médico. O juiz de primeira instância determinou a inversão do ônus da prova, considerando o Código de Defesa do Consumidor (CDC) aplicável, e impôs aos réus o pagamento dos honorários periciais. Inconformado, um dos corréus interpôs agravo de instrumento questionando essa distribuição de custos.
A discussão central era se a inversão do ônus da prova justificaria, automaticamente, o custeio integral da prova pericial pelo réu. O relator entendeu que, ainda que se aplique a inversão do ônus, isso não isenta os autores da responsabilidade pelo adiantamento dos custos quando são os requerentes da perícia.
A Corte decidiu que a inversão do ônus da prova não afasta o princípio da proporcionalidade e do artigo 95 do Código de Processo Civil (CPC), segundo o qual as despesas devem ser rateadas entre as partes que requerem a prova. Portanto, manteve-se a inversão do ônus, mas determinou que os custos da perícia fossem rateados, já que o exame foi solicitado por ambas as partes.
Essa interpretação equilibra o direito à prova técnica com a responsabilidade financeira do processo. Reforça-se que a inversão do ônus da prova é medida de justiça em contextos de hipossuficiência, mas não pode ser utilizada como justificativa para transferir automaticamente encargos processuais sem que haja pedido exclusivo da parte adversa.
A decisão também destaca a importância da prova pericial em litígios que envolvem questões médicas, dado o alto grau de complexidade técnica. Nos casos de erro médico, a perícia é muitas vezes o único meio eficaz de esclarecer os fatos, tornando o debate sobre sua realização e custeio ainda mais sensível.
Ao aplicar a inversão do ônus da prova, o tribunal reconhece que o paciente, leigo em relação aos aspectos técnicos, encontra dificuldades para comprovar falhas em atendimentos e procedimentos médicos. No entanto, reafirma que isso não implica, por si só, a isenção completa de responsabilidade por despesas processuais.
A decisão equilibra o direito de defesa dos réus com o direito de acesso à justiça dos consumidores. A inversão do ônus da prova, ao ser mantida, garante à parte autora uma chance real de ver seus argumentos acolhidos sem a exigência de comprovação técnica plena. Por outro lado, o rateio dos custos evita o agravamento indevido das obrigações impostas aos demandados.
Essa interpretação é coerente com a jurisprudência consolidada no Tribunal de Justiça de São Paulo e no Superior Tribunal de Justiça, que compreendem a inversão do ônus da prova como medida a ser aplicada caso a caso, observando as peculiaridades de cada litígio, sempre com foco no equilíbrio processual.
A decisão serve de parâmetro para ações de responsabilidade médica em que haja múltiplos réus, especialmente quando a perícia é requerida por mais de uma parte. O entendimento do TJSP evita distorções, assegurando que o instrumento da inversão do ônus da prova seja utilizado como ferramenta de justiça, e não como mecanismo automático de transferência de encargos.
Além disso, alerta os advogados e partes interessadas sobre a necessidade de planejamento processual, especialmente quanto aos custos periciais. Reforça-se que, mesmo sob o manto do CDC, é possível que o autor tenha de arcar com parte da despesa da perícia, caso também tenha solicitado a produção dessa prova.
A decisão da 7ª Câmara de Direito Privado representa um avanço na consolidação do entendimento sobre a inversão do ônus da prova em litígios complexos envolvendo o setor de saúde. Trata-se de uma interpretação que respeita tanto os direitos do consumidor quanto as garantias processuais das partes rés, fortalecendo a previsibilidade e a justiça nos julgamentos.
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